A pauta em discussão está na agenda do Le Mond diplomatique, em sua última edição, em artigo assinado por Alain Ruellan, sob o título "ciência e democracia na Amazônia", quando questiona a prática dos pesquisadores isolados ou corporativos que fundamentam formas de intervenção ao meio ambiente Amazônico recorrendo aos paradigmas científicos ancorados em diretrizes políticas assentadas em interesses privados ou públicos, então: como é que se fazem estas escolhas de colocar as suas competências científicas para uns ou para os outros? Onde acontece o debate e quem decide?. Além destas e outras questões formuladas no texto abaixo é importante relevar o valor da política governamental enquanto direção, bem como os tratados de cooperação científica que o Estado brasileiro tem celebrado mundo a fora à revelia das organizações sociais e sem discussão com a sociedade científica brasileira. Por essa via, em nome da ciência, perdemos riqueza e soberania, tornando-nos cada vez mais pobres e subordinados os interesses externas. Ciência e Desenvolvimento são forças que devem ser formuladas de forma convergente seguida de uma prática democrática participativa em direção à economia sustentável e justa ambientalmente.
A Amazônia florestal e rural se submete atualmente a três dinâmicas antagônicas, cada uma das quais é apoiada por pontos de vista científicos, independentes entre si.
1- A primeira pode ser qualificada de violenta por se tratar da destruição dos ecossistemas naturais, que são arrancados e queimados. Em seu lugar aparece uma agricultura de subsistência, em pequenas superfícies ou criação de gados e agricultura produtivista, com traços nítidos de mineração e, em geral sobre imensas superfícies adquiridas de maneira frequentemente ilegal.
Há uma pesquisa agronômica, pública e privada, nacional e internacional, que se relaciona com essa dinâmica violenta. Alguns pesquisadores apóiam os mais ricos desses agricultores/criadores que são os atores dessa destruição. Em contrapartida, há outros pesquisadores que apóiam os pequenos produtores para ajudá-los no melhor aproveitamento das terras desmatadas e, assim, frear a dinâmica do desmatamento.
Uma questão: como é que se fazem estas escolhas de colocar as suas competências científicas para uns ou para os outros? Onde acontece o debate e quem decide?
Devemos acrescentar que essa dinâmica violenta é frequentemente justificada pela exploração dos recursos hidráulicos e minerais. São os cientistas que descobrem esses recursos e que propõem as condições de sua exploração. É claro que, nesse momento, o debate democrático costuma fazer falta.
2- Uma segunda dinâmica é aquela da reserva total em grandes superfícies: qualquer nova ocupação humana é proibida ... salvo a dos eco turistas!!!
O objetivo é conservar, proteger recursos, principalmente ecossistemas; e também contribuir a proteger as funções desempenhadas pelos ecosistemas, principalmente as funções biológicas e climáticas. Portanto, trata-se de se dar tempo para conhecer e para entender.
Para a pesquisa científica, as reservas são verdadeira graça divina: em seu interior, é possível realizar tranquilo todas as observações e medidas que permitem entender os funcionamentos naturais e também as relações que existem entre os meios e as sociedades humanas pouco numerosas que lá vivem.
A pesquisa científica, em geral, desempenha também um papel importante para ajudar a delimitar os "parques" e para associar as populações a essa delimitação.
3- Enfim, uma terceira dinâmica, que pode ser chamada de desenvolvimento sustentável, começa a criar raízes: é a dinâmica daqueles que fazem a escolha de ocupar a floresta para viver dela e, assim, protegê-la. É o que ocorre nas reservas chamadas de "extrativistas", nas quais as populações vivem dos recursos biológicos renováveis. É a dinâmica pela qual Chico Mendes brigou e foi assassinado por aqueles que pertenciam à dinâmica violenta; é a dinâmica do PDSA no Amapá - o programa de desenvolvimento sustentável realizado pelo governador João Alberto Capiberibe de 1995a 2002 - e é também, há cerca de dez anos, a escolha do estado do Acre sob a autoridade dos governadores Jorge Viana e Binho Marques.
A pesquisa científica não está ausente dessa terceira dinâmica, mas é bom refletir sobre as razões de uma presença mais fraca do que nas duas outras. Será o caráter, por assim dizer, mais utópico dessa terceira dinâmica que explica a prudência dos pesquisadores com relação a ela? Ou será que o temor nasce do fato de que o sucesso científico, neste caso, depende de uma relação mais estreita entre pesquisadores e gente do povo?
Atualmente as três dinâmicas disputam uma verdadeira corrida. Durante esses últimos vinte anos, é a destruição violenta, a substituição da floresta pelo gado e pela agricultura produtivista (soja, cana etc), que ganhou e continua a ganhar esta corrida. Apesar da queda recente na taxa de destruição, a destruição anual de 11 mil quilômetros quadrados de floresta natural não pode ser considerada como resultado satisfatório. Destruir a floresta é a solução de facilidade. É a solução economicamente mais interessante a muito curto prazo. Isso porque não se contabilizam, nos custos de produção, as enormes perdas devidas à destruição definitiva das riquezas biológicas e dos solos. Um dia vai ser necessário de pagar por esta destruição e a conta será muito alta!
Em suma, há três dinâmicas em relação às quais o meio científico está presente, mas não se forma unificada: os especialistas se dividem sob o ângulo científico e do ponto de vista político; e isso quer dizer, é claro, que a pesquisa científica, na Amazônia como noutros lugares, não é neutra: ela é influenciável e fortemente influenciada.
Então, algumas questões:
Escolhas políticas foram feitas e anunciadas pelo Presidente Lula com relação à Amazônia brasileira. Desde 2003, a escolha oficial consiste em apoiar a dinâmica de constituição de reservas e a dinâmica do extrativismo sustentável, ou seja, interromper o desmatamento. É uma boa escolha, mas que suscita duas perguntas óbvias: como esta decisão foi construída e como ela é hoje concretizada? Qual foi o papel da pesquisa, qual foi o papel da relação ciência/sociedade na sua elaboração? Esse papel da pesquisa foi limitado. Isso é um dos fatores que limita severamente a concretização da própria escolha. A ausência de preparo e de acompanhamento democrático constitui uma pesada deficiência.
A partir disso, de uma maneira mais geral, uma questão importante é como e onde se fazem as escolhas de prioridade científica e as escolhas de procedimento científico. Por exemplo, como e onde se fazem as escolhas quanto às prioridades agronômicas: agricultura em terras desmatadas ou agro floresta nas reservas extrativistas?
Onde acontecem os debates democráticos que deveriam associar, no momento da realização das pesquisas, os meios científicos aos meios políticos, mas também os meios científicos diretamente às populações? A iniciativa recente de organizar um fórum permanente "ciência e tecnologia na Amazônia", que reúne os principais responsáveis políticos e científicos da região, é importante, mas insuficiente se as populações não puderem entrar efetivamente em cena.
A pesquisa sobre a Amazônia é, de fato, muito dispersa e muito individualista. E, além disso, ela é, em grande parte, realizada por pessoas que não moram na Amazônia, não vivem no dia a dia da Amazônia, nem vivem no Brasil: isso não facilita as relações entre pesquisa e sociedade e não facilita os debates de programação nacional e internacional.
Então, será que a programação científica não é deixada excessivamente nas mãos dos pesquisadores e dos políticos que tomam as decisões quanto aos financiamentos?
Um exemplo para ilustrar: Brasil e França assinaram, há pouco, um pouco às escondidas, um acordo importante de cooperação científica, cujo objetivo é o conhecimento e a exploração dos recursos biológicos da Amazônia. Qual a participação dos pesquisadores e das populações locais – que não querem que a pilhagem de seus recursos persista – neste acordo? Esse acordo pode ajudar a construir o desenvolvimento sustentável, mas com a condição de que as populações sejam claramente envolvidas, responsabilizadas. "O cupuaçu é nosso", gritam, cada vez mais, as multidões da Amazônia. Elas têm razão.
Quero concluir dizendo que não se deve subestimar a importância das forças democráticas e experimentais que existem na Amazônia. A Amazônia já constitui um grande laboratório de experimentação de procedimentos democráticos a serviço do bem-estar das sociedades humanas: é necessário dispor do tempo necessário para conhecer e valorizar essas experimentações. Já se sabe muito sobre os meios e sobre as sociedades da Amazônia. Muitas experiências de estratégias de "desenvolvimento sustentável" já foram realizadas e muitas estão acontecendo agora. O que devemos fazer para que estes conhecimentos sejam utilizados sem mais atraso?
A Amazônia florestal e rural se submete atualmente a três dinâmicas antagônicas, cada uma das quais é apoiada por pontos de vista científicos, independentes entre si.
1- A primeira pode ser qualificada de violenta por se tratar da destruição dos ecossistemas naturais, que são arrancados e queimados. Em seu lugar aparece uma agricultura de subsistência, em pequenas superfícies ou criação de gados e agricultura produtivista, com traços nítidos de mineração e, em geral sobre imensas superfícies adquiridas de maneira frequentemente ilegal.
Há uma pesquisa agronômica, pública e privada, nacional e internacional, que se relaciona com essa dinâmica violenta. Alguns pesquisadores apóiam os mais ricos desses agricultores/criadores que são os atores dessa destruição. Em contrapartida, há outros pesquisadores que apóiam os pequenos produtores para ajudá-los no melhor aproveitamento das terras desmatadas e, assim, frear a dinâmica do desmatamento.
Uma questão: como é que se fazem estas escolhas de colocar as suas competências científicas para uns ou para os outros? Onde acontece o debate e quem decide?
Devemos acrescentar que essa dinâmica violenta é frequentemente justificada pela exploração dos recursos hidráulicos e minerais. São os cientistas que descobrem esses recursos e que propõem as condições de sua exploração. É claro que, nesse momento, o debate democrático costuma fazer falta.
2- Uma segunda dinâmica é aquela da reserva total em grandes superfícies: qualquer nova ocupação humana é proibida ... salvo a dos eco turistas!!!
O objetivo é conservar, proteger recursos, principalmente ecossistemas; e também contribuir a proteger as funções desempenhadas pelos ecosistemas, principalmente as funções biológicas e climáticas. Portanto, trata-se de se dar tempo para conhecer e para entender.
Para a pesquisa científica, as reservas são verdadeira graça divina: em seu interior, é possível realizar tranquilo todas as observações e medidas que permitem entender os funcionamentos naturais e também as relações que existem entre os meios e as sociedades humanas pouco numerosas que lá vivem.
A pesquisa científica, em geral, desempenha também um papel importante para ajudar a delimitar os "parques" e para associar as populações a essa delimitação.
3- Enfim, uma terceira dinâmica, que pode ser chamada de desenvolvimento sustentável, começa a criar raízes: é a dinâmica daqueles que fazem a escolha de ocupar a floresta para viver dela e, assim, protegê-la. É o que ocorre nas reservas chamadas de "extrativistas", nas quais as populações vivem dos recursos biológicos renováveis. É a dinâmica pela qual Chico Mendes brigou e foi assassinado por aqueles que pertenciam à dinâmica violenta; é a dinâmica do PDSA no Amapá - o programa de desenvolvimento sustentável realizado pelo governador João Alberto Capiberibe de 1995a 2002 - e é também, há cerca de dez anos, a escolha do estado do Acre sob a autoridade dos governadores Jorge Viana e Binho Marques.
A pesquisa científica não está ausente dessa terceira dinâmica, mas é bom refletir sobre as razões de uma presença mais fraca do que nas duas outras. Será o caráter, por assim dizer, mais utópico dessa terceira dinâmica que explica a prudência dos pesquisadores com relação a ela? Ou será que o temor nasce do fato de que o sucesso científico, neste caso, depende de uma relação mais estreita entre pesquisadores e gente do povo?
Atualmente as três dinâmicas disputam uma verdadeira corrida. Durante esses últimos vinte anos, é a destruição violenta, a substituição da floresta pelo gado e pela agricultura produtivista (soja, cana etc), que ganhou e continua a ganhar esta corrida. Apesar da queda recente na taxa de destruição, a destruição anual de 11 mil quilômetros quadrados de floresta natural não pode ser considerada como resultado satisfatório. Destruir a floresta é a solução de facilidade. É a solução economicamente mais interessante a muito curto prazo. Isso porque não se contabilizam, nos custos de produção, as enormes perdas devidas à destruição definitiva das riquezas biológicas e dos solos. Um dia vai ser necessário de pagar por esta destruição e a conta será muito alta!
Em suma, há três dinâmicas em relação às quais o meio científico está presente, mas não se forma unificada: os especialistas se dividem sob o ângulo científico e do ponto de vista político; e isso quer dizer, é claro, que a pesquisa científica, na Amazônia como noutros lugares, não é neutra: ela é influenciável e fortemente influenciada.
Então, algumas questões:
Escolhas políticas foram feitas e anunciadas pelo Presidente Lula com relação à Amazônia brasileira. Desde 2003, a escolha oficial consiste em apoiar a dinâmica de constituição de reservas e a dinâmica do extrativismo sustentável, ou seja, interromper o desmatamento. É uma boa escolha, mas que suscita duas perguntas óbvias: como esta decisão foi construída e como ela é hoje concretizada? Qual foi o papel da pesquisa, qual foi o papel da relação ciência/sociedade na sua elaboração? Esse papel da pesquisa foi limitado. Isso é um dos fatores que limita severamente a concretização da própria escolha. A ausência de preparo e de acompanhamento democrático constitui uma pesada deficiência.
A partir disso, de uma maneira mais geral, uma questão importante é como e onde se fazem as escolhas de prioridade científica e as escolhas de procedimento científico. Por exemplo, como e onde se fazem as escolhas quanto às prioridades agronômicas: agricultura em terras desmatadas ou agro floresta nas reservas extrativistas?
Onde acontecem os debates democráticos que deveriam associar, no momento da realização das pesquisas, os meios científicos aos meios políticos, mas também os meios científicos diretamente às populações? A iniciativa recente de organizar um fórum permanente "ciência e tecnologia na Amazônia", que reúne os principais responsáveis políticos e científicos da região, é importante, mas insuficiente se as populações não puderem entrar efetivamente em cena.
A pesquisa sobre a Amazônia é, de fato, muito dispersa e muito individualista. E, além disso, ela é, em grande parte, realizada por pessoas que não moram na Amazônia, não vivem no dia a dia da Amazônia, nem vivem no Brasil: isso não facilita as relações entre pesquisa e sociedade e não facilita os debates de programação nacional e internacional.
Então, será que a programação científica não é deixada excessivamente nas mãos dos pesquisadores e dos políticos que tomam as decisões quanto aos financiamentos?
Um exemplo para ilustrar: Brasil e França assinaram, há pouco, um pouco às escondidas, um acordo importante de cooperação científica, cujo objetivo é o conhecimento e a exploração dos recursos biológicos da Amazônia. Qual a participação dos pesquisadores e das populações locais – que não querem que a pilhagem de seus recursos persista – neste acordo? Esse acordo pode ajudar a construir o desenvolvimento sustentável, mas com a condição de que as populações sejam claramente envolvidas, responsabilizadas. "O cupuaçu é nosso", gritam, cada vez mais, as multidões da Amazônia. Elas têm razão.
Quero concluir dizendo que não se deve subestimar a importância das forças democráticas e experimentais que existem na Amazônia. A Amazônia já constitui um grande laboratório de experimentação de procedimentos democráticos a serviço do bem-estar das sociedades humanas: é necessário dispor do tempo necessário para conhecer e valorizar essas experimentações. Já se sabe muito sobre os meios e sobre as sociedades da Amazônia. Muitas experiências de estratégias de "desenvolvimento sustentável" já foram realizadas e muitas estão acontecendo agora. O que devemos fazer para que estes conhecimentos sejam utilizados sem mais atraso?
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